Tuesday, October 04, 2005

Portugal ontem e hoje.





Lisboa – “chove na cidade sem cor” escreve José Saramago no “ano da morte de Ricardo Reis”, a sua melancólica novela passada em Lisboa. Esta cidade do sul, abençoada pelo sol e pela cor das palmeiras? Sim. Saramago é realista. A sua cidade é uma metáfora para a alma da nação.
Os portugueses não são como os outros latinos. Na minha ultima longa estadia, há cerca de 15 anos atrás, pensei que a melancolia tinha nascido do contraste entre a sua gloriosa história e o seu presente cinzento.
Portugal explorou, abriu o mundo e desapareceu no topo da Europa. Pelo menos a sua negra nostalgia fez nascer o fado, e no meio das suas brincadeiras históricas, estes latinos plantaram a semente de uma das nações mais alegres do mundo, os brasileiros.
Chegado aqui, o meu primeiro pensamento era o de que o estado de espírito deveria brilhar entre as novas auto estradas e viadutos subsidiados pela união europeia. Mas, na minha ultima visita Lisboa mostrou-se bastante diferente de qualquer outra capital europeia, não melhor. A minha primeira impressão estava errada. Porque é que isto nos diz tanto sobre a unificação da Europa e das suas limitações? “Os portugueses estão muito pessimistas, tudo é negativo” diz Rui Constantino, economista dos negócios santander de Portugal. “ As infra-estruturas mudaram [em menos de 15 anos], mas na mente não houve assim tanta mudança. Este país necessita realmente de um abanão”.
Portugal não é suposto estar nesta depressão quase uma geração após a adesão à união europeia. Na porta ao lado, Espanha cresce, fica mais forte e sólida. Após uma ou duas décadas problemáticas na união europeiua a grécia começou finalmente a funcionar. Os novos europeus, aqueles novos dez países que se juntaram há um ano atarás estão a prosperar. Portugal não.
O problema é a economia. Declinou 1% em 2003, cresceu 1% no ano passado. E prevê-se estatisticamente uns insignificantes 0,5% de crescimento em 2005. A Grécia ultrapassou Portugal, fazendo dele o país mais pobre numa Europa a 15.
Porque é que a Irlanda e a Espanha após a sua adesão à união europeia florescem e os portugueses não? O desapontamento e as acusações para com Bruxelas, tão orgulhosos de chamar a atenção para o “tigre celta” e o “milagre espanhol”, é que a união europeia fez pouco e não ajudou a fazer com que o país tivesse sucesso. Trata-se de politicas.
Há uma geração atrás, a Irlanda investiu fortemente na educação. Portugal não o fez. Na última década a Espanha levou a cabo uma segunda onda de reformas económicas, dirigidas principalmente à regulação do capital e do mercado de trabalho. Os governantes portugueses abriam os cordões à bolsa.
A ressaca da festa dos anos noventa não passará rapidamente. Assim que Portugal conheceu os critérios de Maastricht para integrar a zona euro, os interesses convergiram com os do resto do continente. Os portugueses e os governantes sentiam-se mais ricos do que aquilo que realmente eram. Os empréstimos loucos tomaram conta da casa e as pessoas que dispunham de cerca de 50% do seu “income” nos anos 90 e passaram a ter empréstimos até cerca de 120% nos dias de hoje.
O “adolescente” governo socialista direccionou os gastos na criação de empregos públicos levando os capitais públicos até à linha vermelha. Em 2001, o défice fiscal atingiu os 4.1%, quebrando os limites do pacto de estabilidade e trazendo a censura europeia (de novo, aqueles governadores foram coagidos). Hoje, o défice fiscal é de 6.2% e o governo consome metade do PIB. Na última década, Portugal cresceu sem desenvolver a sua produtividade ou construir infra-estruturas para um desenvolvimento futuro. Tal como disse um ministro das finanças: “Nos gastamos como os alemães mas produzimos como os marroquinos. “
Esta divida induzida pelo consumo tomou magnas proporções quando a economia global implodiu em 2001. Desde então o mundo recuperou, mas Portugal não o fez. As infra-estruturas construídas na década de noventa – o orgulho do programa estrutural da união europeia. Continua por aí, sem que lhe seja dado uso. Para que servem tão boas auto-estradas, se não se deslocam camiões suficientes em cima delas?
Tal como os italianos, os portugueses tentam culpar o euro. Os baixos juros dos empréstimos iludiram os portugueses a pedirem empréstimos acima das suas possibilidades. Agora o governo não pode perder nas políticas monetárias para sair fora do pântano. “Se estivéssemos na América latina ou na Ásia, poderíamos desvalorizar o dinheiro agora mesmo” diz Carlos Almeida Andrade, professor de economia da universidade católica de Lisboa. “Mas eu digo, que estaríamos num grande problema sem o euro”. O euro faz Portugal parecer estável. Os investidores continuam a investir. Mas o euro sozinho não resolverá os problemas mais profundos de Portugal.
A força de trabalho é uma das menos educadas da Europa. O país também produz demasiados sociólogos não produzindo engenheiros suficientes. O mercado de trabalho não é flexível nem sequer competitivo. A justiça e a burocracia são notoriamente lentas: para começar um negócio temos de esperar um mês, apenas para que o governo dê permissão para escolhermos o nome para o mesmo. O sistema de impostos é também ele muito complicado.
Porque é que Portugal é tão lento a corrigir estes problemas? “Complexo de Salazar” arrisca o senhor Constantino. Antes de 1974, a ditadura de António Salazar possuía uma economia fechada. Hoje os portugueses continuam a pedir respostas ao estado para resolverem todos os seus problemas.
Miguel Frasquilho, um deputado da oposição do centro direita do partido social-democrata, aponta a culpa ao governo, “Não penso que tenha havido um governo no passado recente que tenha encorajado o país a fazer o que é necessário.”
Nesta lista o senhor Frasquilho inclui os passados governos sociais-democratas, que encabeçam há dois anos a comissão da união europeia com José Manuel Barroso. Como primeiro-ministro o senhor barroso implementou programas de “urgentes reformas estruturais e financeiras” de acordo com a sua biografia da união europeia, mas todos a quem perguntei aqui me dizem que o senhor Barroso se recusou a manter as suas crenças reformistas abandonando Lisboa com muito poucas conquistas. Se o senhor barroso não conseguiu aguentar Portugal, como é que planeia levar a bom termo a Europa?
Os actuais governantes socialistas estão a aumentar a idade da reforma para acumular capital. Em resposta, os militares, oficiais e as suas famílias manifestam-se nas ruas. Enquanto o senhor Frasquilho acusa os socialistas de cederem aos interesses instalados, ele pensa que Portugal precisa realmente de abraçar o estilo da Europa de leste “terapia de choque”, um misto de aperto fiscal, menos apego à regulação estatal e liberalização.
Com toda a gente tão em baixo, é difícil imaginar um milagre português. É igualmente intrigante perceber porque é que esta bonita nação não está a florir. As incomparáveis vantagens de Portugal mentem no que respeita aos serviços, turismo, cortiças e (sim) moldes de plástico – suficientes para um país de 10 milhões de habitantes. “Não podemos mais confiar no consumo para crescermos” diz o senhor Andrade. “Aquilo de que precisamos é de um padrão de crescimento diferente baseado numa competitividade global”ninguém a não ser os portugueses, eles próprios, pode fazer isto acontecer.


Autor estrangeiro desconhecido

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